São Casas. Lugares de
Habitação, de medos, de segredos, de seres fechados em labirintos infinitos que
a História foi tecendo, cruelmente, mas em que elas se foram enredando como
moscas prisioneiras da teia das conveniências sociais e políticas.
“ Casas Pardas”, a Peça
que nasceu da vontade de traduzir o romance de Maria Velho da Costa de Nuno
Carinhas e do trabalho literário de Luísa Costa Gomes, é um prodígio de
economia e sapiência teatral. Nenhuma palavra é inútil, nenhuma personagem é
irrelevante, nenhum gesto se perde no meio da História.
Melhor dizendo, das
Histórias que cruzam uma família da Burguesia Lisboeta – com a sua tríade de
Marias, nome tão português e tão característico do Portugal de Salazar, a
matriarca fria e impassível, Maria do Carmo, as filhas, a menina bonita e mal amada, Maria das
Dores, a irreverente Maria Elisa, o
marido e o irmão – com as vidas das empregadas, dos amigos, , das carpideiras
que choram a morte de todos os que gravitam à volta daquele pequeno mundo em
tons de Farsa. A cena da Ceia em que as
personagens se juntam, usando uma pequena máscara que lhes esconde o olhar, é a
perfeita síntese deste baile eterno de Fantasmas de um país que já morreu, mas
que ainda revela sinais de vida.
Salazar não explica tudo.
Nunca explicou: ele não passou de um pretexto para que uma sociedade
corporizasse o seu reaccionarismo mais primário, os seus complexos de classe e
hierarquia, o seu desejo profundo de viver em plena mediocridade de sonhos e
ambições.
Cada personagem é, em si,
uma Casa. Um espaço encerrado, circular, onde não flui a vida, onde tudo morre
à nascença.
Todas elas sopram o ar de morte e podridão desse Tempo decadente na figura da boneca de
carne e osso que é Maria das Dores. Que se rebela num magnífico monólogo, mas
que está irremediavelmente condenada: sempre será um sub-produto dessa
sociedade familiar que odeia a
individualidade, a autonomia, o pensamento.
Vejamos essas Casas por
dentro. Olhemos as Janelas da Alma do que fomos para perceber, através dos
sinais que esta luminosa Peça de Teatro, de Vida, nos transmite aquilo em que nos
tornamos.
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R. Marques