Mário e Oswald de Andrade, os dois irmãos génios da Literatura brasileira
Apesar do apelido comum, Mário e Oswald não eram irmãos, nem parentes. Mas foram, durante um breve lapso de tempo, amigos e parceiros num movimento artístico que revolucionou a cultura brasileira, tal como a conhecemos.
Primeiro as apresentações. Mário Raul de Morais de Andrade nasceu em São Paulo a 9 de Outubro de 1893, e foi aquilo que podemos definir como um polímato, um talento em múltiplas áreas culturais que se distinguia como poeta, escritor, musicólogo, folclorista e ensaísta, e que é considerado o pioneiro da etnomusicologia.
José Oswald de Sousa Andrade também é nativo de São Paulo, cidade onde veio ao mundo no dia 11 de Janeiro de 1890. Poeta, romancista e dramaturgo, foi o autor dos dois manifestos mais importantes do modernismo brasileiro – o Manifesto do Pau Brasil e o Manifesto antropófago – influenciado pela mistura do futurismo e do cubismo, que descobriu em Paris, e combinou numa mescla improvável com elementos da cultura polinésia e africana.
Estes dois homens talentosos rebelaram-se contra a velha República, controlada pelas Oligarquias do café, que importava os modelos estéticos e culturais e europeus, e os implantava no Brasil. Um pouco à imagem dos movimentos portugueses, desde os “ Vencidos da vida” – Eça, Antero ou Oliveira Martins- ou dos seus contemporâneos do movimento Orpheu – Fernando Pessoa, Mário de Sá –Carneiro – a nova geração brasileira queria marcar a sua posição e impor novos valores.
O Teatro Municipal de São Paulo foi o epicentro da revolta. O Governador do Estado, Washington Luís, apoiou os jovens artistas e, em três dias, personalidades da estatura de Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Victor Brecheret, Plínio Salgado, Anita Malfatti, Menotti Del Pichia, Guilherme de Almeida, Sérgio Milliet, Heitor Villa-Lobos, Tácito de Almeida ou Di Cavalcanti, reuniram-se para discutir as bases de uma nova arte brasileira.
Mário e Oswald de Andrade escreveram os textos fundamentais do movimento : Oswald, como se disse anteriormente, foi o autor do manifesto antropófago e do manifesto do Pau-Brasil, defendendo que era preciso deglutir a cultura brasileira, indo aos seus valores mais ancestrais que se encontravam reflectidos na cultura dos índios e dos negros; Mário redigiu “ Pauliceia desvairada” que é um livro de poemas onde faz uma crítica mordaz ao conservadorismo da cidade de São Paulo, e às várias classes sociais em trechos tão chamativos como “ Ode ao burguês” ou as “ Senectudes tremulinas”, uma referência aos milionários e burgueses que aceitavam, acriticamente, tudo o que vinha de fora, e defende as “ Juvenilidades auriverdes” que são os modernistas que querem transformar a sociedade e a arte que esta produz.
Nesses três intensíssimos dias, o Brasil mudou. Da escultura à música, da literatura à pintura, os modernistas desenharam os novos rumos da cultura do país, mostrando que havia algo muito mais rico que a mera cópia dos modelos europeus.
Sem estes dois irmãos génios da literatura, Mário e Oswald de Andrade, irmãos de espírito, revolucionários com causa, o Brasil nunca teria olhado, interiormente para si, para as suas riquezas culturais, e criado um discurso e uma prática afirmativa e personalizada do que é a cultura brasileira face ao mundo.
António Santos
www.facebook.com/sotaques - www.sotaques.pt - A Revista dos grandes escritores da Língua Portuguesa